O aumento da supervisão vai trazer mais concentração

"Tem sido essencialmente um crescimento orgânico e vamos continuar. Embora nalgumas áreas de negócio, nomeadamente a auditoria, eu acredite que alguma concentração vai ser necessária.”

A afirmação é de Luís Gaspar, responsável da Mazars em Portugal, em entrevista ao Expresso, antecipando mexidas no mercado da auditoria e consultoria. Disse-o antes da notícia de que a EY, uma das bigfour, planeia uma cisão do ramo de auditoria, motivando novas questões.

Como vê este anúncio da EY?
Nós, Mazars, não temos intenção de separar atividades, a questão não se impõe. Temos as barreiras e procedimentos adequados para trabalhar nas várias áreas de negócio.

O que pode trazer para o mercado?
Vamos ver como se faz a separação. Em princípio, alguém vai ficar com o negócio da auditoria. Imagine que é a EY que fica. Não muda muito. E se houver bigfour que se concentram só na auditoria? Depende da forma como se concretizar.

A Mazars quererá comprar?
A dimensão é importante, mas não temos de perder a nossa forma de estar, a questão cultural é importante, que é diferente das bigfour. Não colocamos de parte determinado tipo de operações, embora ao nível de Portugal seria sempre uma operação... não digo difícil, mas tinha de ser muito bem analisada.

Olham com otimismo para os próximos anos, apesar da crise e do aumento da regulação.
A regulação não é propriamente má para o mercado. O nosso mercado tem as bigfour, um conjunto de outras auditoras de média dimensão, um conjunto de pequenas sociedades de revisores... para cumprir com todas estas exigências da regulamentação, vai ser cada vez mais difícil para estas entidades. O aumento da supervisão vai trazer mais concentração.

Quer concentrar-se com quem?
Com ninguém, mas, se existirem oportunidades, vamos, naturalmente, avaliá-las. O que digo é que sobretudo as entidades mais pequenas vão ter necessidade de fazer alguma concentração. Estamos a olhar para o mercado e ver quem nos interessa em termos de geografias, de recursos humanos. Vamos olhar para um conjunto de questões e não só para o negócio propriamente dito.

A passagem da supervisão da Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (CROC) para a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) foi benéfica?
Havia uma diferença significativa da abordagem. Quando a OROC — e julgo que está a trabalhar nesse sentido — se aproximar da CMVM, isso vai ser bom para o mercado, porque precisamos de aumentar a qualidade da auditoria e de aumentar a credibilidade da profissão.

Tem mais alguma proposta de reforço da regulação e supervisão?
Em França existe uma coisa que é a joint audit, a auditoria conjunta. É ter dois auditores a assinarem a mesma opinião. Repartimos o trabalho, olhando em conjunto para as áreas críticas e assinando a mesma opinião. Para algumas entidades de determinada dimensão ajoint audit era importante, porque responde à questão da qualidade da auditoria e do aumento da qualidade. Ia permitir que outras sociedades que não as bigfour entrassem noutro tipo de clientes.

Qual a vantagem de haver dois? O trabalho não é credível?
Quatro olhos são sempre melhor do que dois. Na situação em que estamos hoje e tendo em conta o negócio da auditoria, o que temos é a dança das cadeiras, só que temos quatro cadeiras e quatro dançarinos. Não tenho dúvidas de que as bigfour têm implementado os sistemas que permitem [combater problemas]. Mas quando são quatro cadeiras e quatro dançarinos, em algum momento temos tendência para nos esforçar menos, porque sabemos que temos uma cadeira.

Se fossem cinco estaria melhor?
Não é esse o objetivo. Imagine que — e é possível, tendo em conta as movimentações — que uma das bigfour decide largar a auditoria. Como é que o mercado se ajusta? É preciso criar condições para que haja outras auditoras capazes de fazer o trabalho. Se alguma abandonar, no momento imediatamente a seguir vai ser difícil haver oferta.

Será uma oportunidade para vocês.
Obviamente, mas o que dizemos é "então vamos começar a preparar as coisas”. Não é de um dia para o outro que se diz “agora tem a maior empresa portuguesa que precisa de ter 30 ou 40 pessoas dedicadas”.

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