Oito eixos e quatro agendas num programa de 33,6 mil milhões

Depois da definição dos três principais motores da recuperação económica europeia pela Comissão, coube a cada país identificar as áreas chave nas quais colocar este plano em prática. Em Portugal, o foco está na coesão territorial e inovação.

O Governo definiu já os eixos estratégicos orientadores da aplicação do PT2030, de forma a revitalizar e modernizar a economia nacional. Com cerca de 33,6 mil milhões de euros a chegar nos próximos seis anos, são oito as dimensões prioritárias que, no seu ver, responderão aos principais desafios económicos e sociais do país, tanto os causados pela atual conjuntura pandémica, como os estruturais.

Apesar de serem apontados como uma oportunidade única para o país, os fundos europeus que chegarão a Portugal nos próximos anos constituem igualmente um desafio, pela necessidade de aproveitar ao máximo este recurso. Foram assim definidos eixos tendo em conta as quatro agendas temáticas do programa Portugal 2030: pessoas primeiro; digitalização, inovação e qualificações como motor do desenvolvimento; transição climática e sustentabilidade; e, finalmente, a competitividade externa aliada à coesão interna.

O primeiro eixo de ação relaciona-se com “Inovação e Conhecimento”, que encontra vários pontos de contacto com o segundo eixo, o da “Qualificação, Formação e Emprego”. Estes dois visam sobretudo um incremento de competitividade através de novas tecnologias e processos inovadores, bem como da dotação dos recursos humanos necessários à manutenção desta dinâmica.

Este será um eixo com implicações transversais às várias indústrias, dada a expectativa de modernização de grande parte da economia.

“Na base destes investimentos deverão estar projetos inovadores, bem como projetos voltados para a internacionalização e geradores de emprego. As tecnologias de informação e comunicação terão aqui um papel fundamental como motor de desenvolvimento da área de serviços, continuando a aposta na nova geração de agricultores e na revitalização do turismo e da indústria”, explica Dário Gaspar, diretor da We Incentivos.

De seguida, a sustentabilidade demográfica será um dos eixos estruturalmente mais relevantes, dada a envelhecida população portuguesa e a sua distribuição geograficamente assimétrica. Para Dário Gaspar, estes são os três eixos principais do programa, quer pela sua relevância na economia do futuro, quer pela importância de equilibrar demograficamente o país, e constituem os “Objetivos Horizontais” definidos pelo Governo, pela sua transversalidade a grande parte da economia.

Os restantes eixos são classificados como “Objetivos Territoriais”, visando a promoção de uma maior coesão dentro do país e diminuição das assimetrias regionais que há muito se verificam.

A “energia e alterações Climáticas” apresenta-se em linha com um dos principais objetivos enunciados pela Comissão Europeia para a recuperação europeia, a transição climática. Este é um dos exemplos de complementaridade entre os vários instrumentos disponibilizados pela UE, dada a forte componente ambiental do Next Generation EU.

Outro objetivo intimamente relacionado com a promoção de uma transição ambiental e energética para um futuro mais sustentável prende-se com a aposta na economia do mar, vista como um dos maiores ativos do país.

“O mar é uma das principais fontes de material de base biológica que urge preservar e valorizar. Acima de tudo, o mar alberga serviços ecossistémicos e capital natural que, se bem geridos, permitirão a Portugal prosperar e ter um papel de destaque numa década marcada pelas alterações climáticas e pela escassez de alimentos”, refere o documento de Enquadramento Estratégico do Portugal 2030, que menciona ainda a criação da “Rede Nacional de Áreas Marinhas Protegidas no mar português e definidos os respetivos planos de gestão, de forma a proteger os principais habitats e ecossistemas marinhos vulneráveis e dar cumprimento aos compromissos assumidos no âmbito das Nações Unidas de abranger 14% até 2020 e 30% até 2030”.

Por outro lado, também a agricultura e as florestas são elencadas como uma das prioridades na ação do programa, dado “o elevado valor económico total da floresta”, que “decorre não só da sua realização comercial, mas também dos serviços ambientais e sociais que presta”. Frequentemente associada ao meio rural, esta dimensão do programa relaciona-se proximamente com a competitividade e coesão dos territórios da baixa densidade. Finalmente, a necessidade de reforçar a competitividade externa do país levou à definição do eixo “Redes e Mercados Externos”.

“Os territórios da baixa densidade caracterizam-se por perda populacional, falta de mão-de-obra qualificada, fracos serviços públicos e privados de suporte, fatores que minam a atratividade. Os fundos podem ajudar no combate das insuficiências e assimetrias regionais quando canalizados para projetos estruturantes na região ou para o reforço da competitividade dos players locais, criando condições para atrair e reter pessoas, gerar emprego e riqueza, reforçar cadeias de valor e assumir um verdadeiro efeito multiplicador”, argumenta Celso Fernandes, Financial Advisory Senior Manager da Mazars , sublinhando a importância deste objetivo.

Ao contrário do que sucederá com o Plano de Recuperação e Resiliência, que tem um foco sobretudo no público, o Portugal 2030 representará uma oportunidade para as pequenas e médias empresas levarem a cabo necessárias ações de modernização, qualificação e internacionalização, salienta Sérgio Oliveira, partner da Deloitte e ReStart Center for Business Leader.

“Para o setor privado, importa destacar, no contexto do Portugal 2020 e da Estratégia Portugal 2030, as oportunidades para a concretização de projetos de inovação produtiva, investigação e desenvolvimento e ainda de qualificação e internacionalização, nomeadamente para as Pequenas e Médias Empresas”, refere.

Esta é uma dimensão também salientada por Paulo Pires, Diretor Incentivos & Benefícios Fiscais da HM Consultores.

“Se olharmos para o próximo Quadro Comunitário Portugal 2030, somos da opinião que as principais novidades estarão no acesso mais limitado a grandes empresas (promovendo inclusivamente a uma maior segmentação entre empresas que, sem dúvida, beneficiará o tecido empresarial português intensivo em mão-de-obra)”, sublinha.

InJornal Económico